quarta-feira, 18 de março de 2009

Bem que precisávamos de mais pessoas como Clodovil...


Ele se foi. Com ele, um doce e polêmico capítulo na nossa história, da moda e da política. Clodovil Hernandes não era um cidadão ou um parlamentar comuns. Ele transcendeu aos limites da excessiva noção de perfeição, de capacidade profissional, de ética. Clodô, como gostava de ser chamado, virou prato predileto de imitadores e cartunistas, mas sempre se portou com dignidade não comum, principalmente no mundo político. Um dia, cansado da vida de figurinista destemido e contraditório, achou que deveria se dedicar à política, e por brincadeira - só pôde ser - lançou-se candidato e, para espanto, obteve mais de 300 mil votos e foi o terceiro mais votado do estado paulista. Marcou sua vida parlamentar como na vida de cidadão. Mas, e aí é que existe o diferencial, ao invés de se conformar com a mesmice do Parlamento, mostrou sempre revolta com o quotidiano da Câmara. Logo de início, num discurso, gozou o fato da falta de respeito dos colegas, que conversavam ao invés de dar-lhe atenção. Obteve o silêncio respeitoso. Filho extremado, tinha na mãe um exemplo que sempre fazia questão de mencionar, com respeito e admiração. Clodovil era assim. Debochado, hilário, mas sincero e honesto (qualidade que não encontrou entre seus pares), e às vezes doce e meigo, quando queria. Ele, que não se dobrou à mesmice da moda - sempre inventava e provocava espanto -, nem aos costumes quotidianos antiquados (que ele sempre abominava), chegou à Câmara e marcou presença, embora não tenha pautado sua vida parlamentar por projetos nem iniciativas, a não ser a de reformar seu gabinete, ao custo de mais de 200 mil reais. Ele achava o local sem graça, triste, sem criatividade. Logo ele, costureiro autodidata, que inovou e se destacou no mundo da alta moda. Primeiro, na TV Globo, ancorando um telejornal dedicado à mulher. Depois, como jurado de programa também da TV, onde, como sempre, fazia da polêmica sua principal característica.
Homossexual assumido - ao contrário de muitas "estrelas" exibicionistas - sempre manteve sua vida sexual sob a mais absoluta discrição. Era sempre educado e contido, mas, quando alguém lhe pisava nos calos, se comportava como um leão. Não aturava desaforo e dava o troco sempre, fosse para quem fosse. Sua personalidade ficou patente em pronunciamento na Câmara, quando chamou uma colega de feia, entre outras coisas. E realçou: "Ela é feia mesmo, não é?".
Recentemente, foi objeto de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal, por infidelidade partidária - onde fez questão de estar presente - e foi absolvido por unanimidade. Coincidência do destino, dias depois, deu entrada num hospital de Brasília com problemas do coração. Nem sequer teve tempo para saborear a doce e justificada vitória. E o doce e meigo (quando queria ser) Clodovil Hernandes, corajoso e destemido (sempre) quando na Câmara Federal, não conseguiu sobrepujar mais este adversário. Primeiro, com um demorado coma; depois, com morte cerebral e, finalmente, com a despedida desta vida que o tornara um dos maiores cidadãos brasileiros dos últimos tempos. Clodô se foi. Com ele, um dos poucos grandes figurinistas da alta moda. Com ele, um parlamentar honesto e polêmico, que, ao contrário dos demais, dizia o que pensava, a ponto de criticar o falatório no Plenário quando ele falava. Falou e disse, sim senhor, cidadão e parlamentar Clodovil Hernandes, que deixará muitas saudades. Nossos respeitos e nosso pranto.

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