quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

O trem da beira...


"São tão remotas as estrelas, que apesar da vertiginosa velocidade da luz, elas se apagam e continuam a brilhar durante séculos. Morrem os mundos...Silenciosa e escura, eterna noite cinge-os. Mudas, frias, nas luminosas solidões da cultura. Erguem-se, assim, necrópoles sombrias..."(Euclides da Cunha)

Aquela cidade as margens do rio deu a impressão a Giovanna de que ela estava deslocada no tempo, na margem direita ficava o presente, na esquerda o passado. A visão da correnteza a deixa enjoada como se fosse uma mulher grávida, mas aquelas águas barrentas parecem ter o poder de irrigar seus olhos, ela chora de saudades, de medo e de ansiedade. Então caminha ao sol e esse lhe faz suar as bicas, como se estivesse derretendo a pele e os ossos, mas ela parece gostar desse calor amazônico, parece lhe fazer bem o fervilhar do sangue em suas veias que aos poucos vai apagando aquele estranho vazio em seu olhar. Sentou-se num restaurante para almoçar e beber água, há um ditado na região que diz: quem bebe água de lá pode ir embora, mas sempre um dia irá voltar. Imaginava que não duraria não mais do que uma semana lá. Agora depois que bebeu a água e foi picada pelos mosquitos não tem mais vontade de partir. Da sacada de onde estava sentada podia ver as grandes árvores na fímbria da floresta, as castanheiras se destacavam, com suas altas copas e seu tronco longo. De lá ela não via, mas sentado a sua sombra estava um moço, e eles ainda nem se conheciam, mas o vento se encarregaria disso. O perfume dela chegou até ele e o seu cheiro despertou nele um instinto de macho, que não é rude, mas sedutor. Tinha o rosto comprido e longilíneo, os olhos como duas janelas que precisam do sol e o contorno das sobrancelhas seguindo sinuosamente e acen­tuando a vontade de viver e de ser feliz que seus traços traziam. A pele não era alva, mas de um tom próximo de chocolate clarinho, perfeita para seu corpo bem harmônico. Antes que eu tomasse o trem, o céu estava sem nuvens emoldurando o sol que com seu calor de mil graus fazia o suor porejar por toda a pele. Sentou-se no terceiro vagão na segunda fileira, ele estava na terceira. Quando a composição começou a se movimentar eles estavam frente a frente, pois ele sentou-se na posição de quem viajava de costas para a Maria Fumaça. Giovanna adormeceu lentamente com os barulhos do trilhos e antes de fechar os olhos vislumbrou ele em seu formoso traje branco. Sem saber eles tinham o mesmo destino, a locomotiva os levaria até a capital onde lá tomariam um barco que os levaria cinco dias navegando até Manaus.
...(",)