terça-feira, 25 de novembro de 2008

Décadas perdidas...


Eu consigo enxergar no cerne pavoroso dessa recentíssima crise mundial a face fiel da ganância dos homens dos dias atuais. É a selvageria inóspita aos que costumam gritar o já famoso “salve-se quem puder”. Parece que, nesse clima, ficar rico é a idéia mais densamente aceita, independente dos meios usados para se obter esse fim. Creio que nunca foi tão urgente criar-se uma ordem sócio-política nova, onde possamos encontrar menos vícios e mais atos zelosos do ponto de vista ético e moral. Deixamos de fazer muitas coisas boas entretidos com o ranço desse modelo que desenhamos e usamos nas últimas duas décadas – quiçá três. O passado que vivemos nos mostrou o sensato e o nem tanto. Escolhemos um modelo desumano para vivermos. O homem ficou à margem do lucro e do enriquecimento; o bicho-homem alimentou a ganância em um desembestado gesto de apego ao supérfluo e pouco entendível pelos justos e marginalizados pelo sistema mundial do lucro. A verdade jamais poderá morrer diante da fantasia dos exagerados que, sem nada terem feito de substancioso, cobram aos berros o que nem sabem nem podem. Há uma crise dentro de outra. A globalização chegou e não nos preparou para saborearmos seus frutos amargos. Quando a percebemos, já estávamos contaminados. Será que toda essa crise não será mais política do que realmente comercial? Os mesmos que a constroem a destroem. Quando ela nasce, logo em seguida já se sabe qual é o seu antídoto, como se pronto ele estivesse para ser usado quando os economistas resolvessem fomentar a anticrise. Fala-se em crédito como se esse possuísse identidade física e endereço conhecido. O homem se apequena tanto diante dele que é mais fácil para nós consumidores ouvir cada vez mais do que sequer falar uma palavra. As amarras do tom crísico são fenomenais, rudes e apavoradoras. A maior crise mundial é a falta de alimentos, empregos e vergonha na cara. O dinheiro tem servido irresponsavelmente a Estados e bandidos. O crédito tem de ser tomado a todo custo, faroleado pela voracidade midiática e, muitas vezes, pela desatenção dos consumidores. O mundo está faccionado, e cada pedaço dele contribui com um pedaço da crise global. A usura tem extraído além da conta as riquezas do subsolo. A terra é provocada quimicamente a produzir cada vez mais. Os famintos se multiplicam, e os gananciosos, esquivando-se de qualquer responsabilidade, apenas pensam no comércio e nos lucros. Enquanto isso, o homem pára de sonhar e torna-se um alvo fatídico dessa crise bestial e desnecessária para os que almejam viver bem. A crise está dentro de cada um de nós isoladamente. Quando nos ajuntamos ela se revigora e abunda pesadelos em nossa convivência diária. Estamos descarrilados, perdendo o referencial familiar e desumanizando-nos. Há um homem que constrói a crise e o outro que a lamenta e chora. Carecemos repensar valores, reconstruir o mundo, redimensionar nossos desejos e reaprender a sonhar. Já é tarde para muitas coisas, mas não para todas elas. Apenas o reolhar não nos bastará. Carecemos de fôlego novo, idéias despoluídas e uma vontade sã. Há um homem dentro de nós que está a perder-se e um outro nem tão distante que pode ainda ser achado. Quando resolvermos a crise de cada um de nós, a crise de todos estará então resolvida.
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