Disse adeus a um medo. Na despedida, tantos outros foram embora! Agora, com eles longe, fico sem saber se a passagem era de ida e volta. Mas que me importa, por ora? Cresci em segundos, ali, na plataforma da vida, embarcando os temores. Mergulhei na leveza de me desprender, salgando e azulando os sentidos. Como se tudo a partir de então fosse possível, mesmo não sendo. Certa inocência vi recuperada, reconduzida ao encanto de ignorar com sabedoria. Depois de séculos, livre, livre de novo...! Os mais chatos me dirão: "mas tal fato só pôde se dar porque é a resultância de um processo". E eu não sei, Doutor Racional? Só que me refiro ao aspecto mágico de uma conquista. Acordar no meio da noite, com a surpresa da paz, vinda não sei de onde, ciente de que tudo o que se tem é a momentânea existência (ainda que a reconfortemos com futuros ou passados gloriosos, ainda que a fustiguemos com esses mesmos pré e pós). E se alegrar com o nada que é a vida, senão sua recriação constante. Dia após dia, dor após dor, alegria depois de alegria. Olhar com bons olhos a marcha incessante de um incógnito tempo. Não temer tanto perdas, solidões; entregando-se apenas à brisa que sopra o presente, no máximo torcendo para que haja sorriso no próximo desjejum. Quem sabe três novas alegrias no almoço? Mas vem pra cá, brincar de montar o destino não é tão legal quanto aprender uma nova lição! Veja só, olhe como é que se faz. Não gosta? Ah, deve haver outras formas de se fazer. Não há? Invente-as, pois. Melhor reencarnar várias vezes numa mesma vida do que esperar que a Divina Providência o faça. Liberte o que há para viver, com coragem, parindo novas possibilidades. Só não dê nome, sobrenome, e uma única função para o existir. A vida tem muito mais sabor quando é ainda só barro.
sexta-feira, 31 de agosto de 2007
quinta-feira, 30 de agosto de 2007
Quem sabe faz a hora...
quarta-feira, 29 de agosto de 2007
Tanto quanto, ou mais...
Penso que seria mui vazio a vida sem vazios. Meus vazios me fertilizam tanto quanto me estancam. Ou mais. A falta pode levar à aquisição de um bem, como a grafite pode levar ao diamante, a concha à pérola, o sal ao mar. Minhas lacunas eu preencho continuamente com a força da possibilidade e da circunstância. Criar é improvisar tanto quanto planejar. Ou mais. O espaço que eu ocupo é o da tela em branco refletida no sonho em cromaqui, a partir do qual o azul leva a qualquer coisa que nele se projete em forma, conteúdo e ação. Será por isso que estamos, eu e a humanidade, em perpétua espera pelo novo? Será por isso que facilmente nos entendiamos, e inventamos novas formas para velhos conteúdos, tanto quanto novos conteúdos para velhas formas?
Penso que seria mais triste se eu nunca houvesse entristecido. Meus dramas me fecundam tanto quanto me esterilizam. Ou mais. A tristeza pode levar ao crescimento interior, como o aprendizado que se inicia com dor, a uma sólida alegria, como a natureza, a algum tipo de Deus. Minha melancolia eu alimento continuamente com a força das minhas imperfeições e autocríticas. Sofrer é se burilar tanto quanto se destruir. Ou mais. O espaço que a desgraça ocupa em mim é o da lágrima que se cristaliza na memória, a partir do qual a estrutura ocular faz refletir as emoções mais intensas. Será por isso que estamos, eu e a humanidade, em busca quase sempre de vibrantes emoções? Será por isso que rejeitamos com muita freqüência a atmosfera morna dos sentires, e inventamos amplitudes diferentes para uma mesma sensação, tanto quanto multiplicamos sensações de mesma amplitude?
Não sei, eu não sei. E esse não saber é que me inaugura...
Vilarejo espelhados!
Fiquei com a pergunta ecoando em mim e desconfio de que o meu vilarejo nem é tão secreto assim, é transparente, feito a água cristalina que corre no rio que passa praticamente ali na minha porta. Retiro tudo o que preciso da minha própria horta, com todo mundo podendo ver. Às claras, às escuras. Sem vergonha, sem pudor, sem incômodo, sem temor. Cada um, a princípio, tem permissão para percorrer cada espaço, cada cômodo meu, mas... só quem traz um vilarejo sincero e não pré-fabricado é que consegue olhar no espelho e ver tudo, tintim por tintim, até o fim, porque, no fundo, todo mundo acaba sendo um pouco reflexo do outro...