quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Um velho que caminha só...


Sentada na areia fiquei olhando aquele senhor caminhado em direção ao mar.Nesse momento ele é um dos personagens da minha vida e nem sabe quem sou eu. Ao olhar para ele vejo meu avô, e me vejo quando a vida estiver mais longa em anos que passaram e mais curta em anos que restaram. Os cabelos brancos dele são testemunhas dos anos que viveu. A natureza parece tão sábia quando torna brancos nossos cabelos, é como se viver uma longa vida fosse uma forma de purificação. Consigo visualizar naqueles olhos cansados que ele não tem mais medo das sombras porque sabe que por de trás delas está a luz. Só de olhar para ele sei que foi nascido em tempos rudes mas que viveu grande parte da sua vida para construir e garantir dias melhores para uma família que criou. Mesmo depois de mortos, mesmo assim ele viveu em nome do seu pai e por sua mãe. Ainda que por caminhos árduos ou mesmo tortos ele fez tudo para ser mais feliz do que eles e para ver mais feliz ainda seus filhos que hoje também são pais como ele é.Suas fragilidades humanas fizeram com que quisesse morrer antes da hora, mas a vida é uma ordem, não há essa escolha. Não se pode abreviar seu tempo, seria um desperdício depois de tanta batalha. Nesse momento lembro-me de Cora Coralina:“Não sei... se a vida é curta...Não sei...Não sei...se a vida é curta ou longa demais para nós. Mas sei que nada do que vivemos tem sentido, se não tocarmos o coração das pessoas. Não falta mais nada e isso não é coisa de outro mundo: é o que dá sentido à vida...É o que faz com que ela não seja nem curta, nem longa demais, mas que seja intensa,verdadeira e pura...enquanto durar.”Para aquele senhor agora voltando do mar, parece que não falta mais nada, tudo parece já estar resolvido. Seus sonhos se já não estão realizados, hoje estão depositados nos seus filhos e netos que são o amanhã, que são a continuidade do que ele plantou. Obstinado educou todos eles, homens e mulheres, para serem fortes, para lutarem até a última gota de sangue. Para derramarem lágrimas de dor e para transbordarem alegria quando fosse a hora. Ao olhar para eles, aquele senhor se vê e isso tudo faz sua vida ter valido a pena. As cortinas de seu espetáculo estão se baixando lentamente, ele não tem medo da morte, ainda que ela seja dolorosa. Porque gravou sua vida nos corações de muita gente, ousou desafiar barreiras e a vencer desafios que pareciam intransponíveis. Sua obra está pronta, sua missão parece estar cumprida. E isso lhe dá a força de mil sóis para suportar qualquer dor.Ao vê-lo caminhar lentamente entendo tudo. De repente não tenho mais dúvidas de nada. A vida é um ciclo perfeito, morremos como nascemos. O fim da vida é a volta para o começo....