quarta-feira, 17 de março de 2010

Amargo da língua...


Estou me vendo como uma pedra que não pensa, mas que chora por estar no meio do caminho, me vejo como um sol que morreu e que esfria a cada segundo. Olho pra mim e enxergo uma janela rasgando a parede, que se abre para o dia e que mostra para o cativo de si mesma que a liberdade está apenas a um passo seu. Enxergo-me como uma luz, um clarão que rompe a noite que parecia eterna sobre a cabana. Quando sou feita de carne sou grama esparramada pelo chão, a mesma grama onde me deito com ele, e onde hoje é nosso leito e amanhã será nosso túmulo, sou água da fonte sorrindo porque sabe que será rio e que um dia matará a sede. Sou passarinho que voa desafiando as gravidades, que usa suas asas como reza ou poesia, que do alto contempla os homens perdidos em seu gozo e em toda sua agonia. Quando sou feita de palavras, quando sou feita de pensamentos ou mesmo de ar, a minha alma é uma fotografia, um mosaico de imagens e de poeira, sou essa hora de dor em que sou santa, e esses momentos de prazer em que sou pecadora, sou uma boca que beija como quem morde porque no canto dos lábios tem doce e um segredo calado no amargo da língua.
...(",)